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Bares, botecos & fiados: O bar do Marcelo


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Não sei por que este bar se tornou uma opção única na cidade. Aconteceu de todo mundo só se reunir ali. O bar era do Marcelo e do cunhado dele e eles diziam que o nome era Tô Na Boa mas esse nome nunca pegou. Claro que existiam outros bares, mas ali era o canal! E como fazíamos sempre, a galera marcou a noitada lá. Não lembro por que diachos cheguei tão cedo e a Edna tinha dito que iria se atrasar de qualquer forma. O Diogo e o Saracura sempre chegavam mais tarde, bêbados porque tomavam umas antes num boteco da Vila Sapo, porque era mais barato. Duros tempos em que éramos todos duros.

Então eu tava lá sentado na mesa do canto, o Marcelo na cozinha preparando algum lanche ou sei lá o que, e o André Pimenta, vulgo Zenaide arrumando as cervejas no freezer. Apesar da trilha sonora [uma fita com o lado A dos Doors e outra lado B dos Stones] dava pra ouvir as garrafas batendo no fundo do freezer. O Zenaide era meu amigo também e trocávamos várias ideias e eu gravava umas fitas de rock pra ele. Tinha esse apelido por que era o nome da mãe, que era uma figura, a dona Zenaide. Fora a gente tinha três peões numa mesa no fundo bebendo e conversando animados.

Mas só eu vi quando ela entrou.Tipo do nada, apareceu! Bonita! Lindona! Gata pra caralho!

Um cabelo liso, todo escorrido, vestida de preto com um coturno e umas bandanas amarradas no braço... meio rock, meio gótica. Sentou sozinha no balcão e vendo o Zenaide agachado disse um 'boa noite' bem sonoro, porque ouvi da minha mesa. O Zenaide levantou e meio abobado disse um 'e aí, beleza?' que ela respondeu com outro 'beleza!'. Na sequência ela pediu um submarino. O Zenaide que tava meio abobalhado com a beleza da mina parou, olhou bem pra ela e disse um 'ôloco, aqui só tem barquinho'. Ela sorriu sem graça, decerto que não entendeu... mas ele também não tinha entendido e continuou brincando ' submarino daqueles que torpedeiam?' e ela respondeu ainda sem entender 'é!'. Olhando de fianco e com um sorriso amarelo no rosto o Zenaide foi pra cozinha no fundo do bar falar com o Marcelo. Voltaram os dois, o Marcelo de avental cumprimentando a moça 'boa noite, tudo bom?' e ela sorridente respondeu afirmativa. Ai o Marcelo enquadrou a guria 'foi você que pediu o submarino' e novamente ela confirmou. O Zenaide com aquela cara de diarreia sorridente logo atrás. E o Marcelo 'mas o como é que é isso?'. Foi aí que a moça percebeu que eles não sabiam o que era e explicou o drinque: um copo pequeno com steinhaeger dentro de uma caneca grande de chopp ou cerveja, que quando vira mistura aos poucos. O Marcelo na hora soltou um 'ah, é?' e virando pro Zenaide disse 'faz ai pra moça!'. O Zenaide pegou o steinhaeger e trouxe pro balcão. Quando ele trouxe a caneca com a cerveja a moça se adiantou 'dá aqui que eu faço'. O Zenaide viu que eu tava sacando tudo e gritou do outro lado 'ô Mono, chega ai' [meu apelido sempre foi Monocelha]. Me aproximei e ela sorrindo começou a virar o submarino enquanto a gente assistia salivando! Não resisti e falei pro Zenaide que queria um também e ele teve a manha de preparar como o dela. Puxei papo e ela muito simpática começou a conversar comigo, chama-se Rita e tava de visita numa fazenda da cidade. Logo chegou o meu submarino que provei com vontade, uma delícia! O bar começou a encher. Fui me aproximando da Rita, o Zenaide havia aumentado o som e uma banda de amigos nossos, Los 3 Amigos, chegou e começou a arrumar o equipamento por que iria ter som. No segundo submarino eu já tava conversando altos papos com a Rita, bem coladinho mesmo quando ela parou e ficou olhando bem nos meus olhos, no fundo. Um olhar esguio, de canto mas que brilhava apesar da maquiagem pesada. Fiquei olhando meio bobo meio bêbado e ela me lascou um beijo, assim do nada. Senti seu lábio quente e cheio de paixão com o sabor de steinhaeger e chiclete de menta. Só paramos quando escutei o Zenaide gritar 'ôloco'. Nunca fui o tipo que chamava atenção das meninas. Quando parei de beijar vi a Edna e a Solange, uma outra amiga, olhando do lado de fora do bar. Acenei pra elas e elas entraram e apresentei a Rita e contei do submarino que elas quiseram experimentar. A banda começou a tocar os clássicos do rock e a Rita levantou sem dizer nada e foi dançar bem na frente. Fui também, mas fiquei mais de lado por que sempre achei que dançava mal. As meninas começaram a dançar também e logo chegou os Saracura , o Diogo e os outros caras, que gostavam de pular e cantar junto. Quando percebi tava todo mundo tomando submarino e todo mundo louco dançando muito. A Rita vinha de vez em quando e me dava uns beijos. Fui ficando bem mole e aí já tava pulando enlouquecidamente durante a noite. Quando começou a tocar I Wanna Be Sedated surtamos aos berros e pulos. Agarrei a Rita e fui dar um beijo quando ela me deu um tapa na cara! Parei por um instante e ela me lascou um beijo mais intenso que correspondi mas sem entender lhufas. Saímos do bar e continuamos aos beijos. A Edna saiu também pra cuidar da Sô que tava vomitando. De repente, parou um carro preto chic no úrtimo, como dizemos, e chamou a Rita. Ela falou qualquer coisa, voltou e me beijou na boca de novo mordendo meu lábio e dizendo 'a gente se vê' entrou no carro.

Nunca mais soube dela mas lembro toda vez que peço um submarino, que aliás virou febre na cidade. Na noite que levei meu primeiro tapa entendi o significado de tesão. I wanna be sedated.


[Fábio Shakall, Setembro 2014, SP/BR]


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